Em 6 de agosto de 1912, na cidade de Valinhos, nascia mais um dos muitos filhos do casal de imigrantes italianos Francesco "Fernando" Rubinato e Emma Ricchin: João Rubinato, que anos mais tarde seria considerado um dos maiores representantes do samba paulista, mas não com o nome de batismo e sim com o pseudônimo que ele mesmo escolheu, homenageando duas pessoas que lhe eram muito queridas: um amigo chamado ADONIRAN e o cantor e compositor carioca Luís BARBOSA. Foi assim que João Rubinato virou ADONIRAN BARBOSA (foto).
Adoniran foi compositor, ator de rádio, cinema e televisão, além de pintor e escultor. Meu primeiro contato (auditivo) com ele deu-se quando eu tinha apenas oito anos de vida. Meus pais gostavam muito de ouvir rádio e às sextas-feiras às 21 horas sintonizavam a PRB-9 Rádio Record “a maior” para ouvir “Histórias das Malocas”, programa humorístico escrito por Osvaldo Moles, onde Adoniran interpretava o personagem Charutinho, sempre às voltas com sua amada Pafunça, interpretada por Maria Amélia. No cinema nosso protagonista fez parte do elenco de “O Cangaceiro”, produção paulista da extinta Cia. Cinematográfica Vera Cruz, em cuja trilha sonora havia números musicais interpretados pelos Demônios da Garoa, conjunto musical que viria a gravar boa parte das composições de Adoniran.
João “Adoniran Barbosa” Rubinato percorreu a Paulicéia com seus sambas, celebrando ou citando vários bairros e logradouros da nossa cidade. Este texto, sem a pretensão de esgotar o assunto, relembra algumas dessas citações.
(Adoniran Barbosana na praça da Sé; foto de Pedro Martinelli, 1978)
Começando pelo Centro lembro-me da triste “Iracema”, contando a tragédia vivida por uma grande paixão, que morreu atropelada na Avenida São João. Falando em amores vem à lembrança “Apaga o fogo Mané”, onde Adoniran narra as desventuras de um homem à procura da mulher que saiu e não voltou mais, chegando a procurá-la na antiga Central de Polícia, no Pátio do Colégio.
Ainda citando a região central de nossa cidade temos “Samba no Bexiga”, satirizando os costumes da grande colônia italiana de São Paulo, da qual Adoniran era um dos integrantes.
A Zona Leste foi muito visitada por Adoniran. O conhecido “Samba do Arnesto” narra a saga de amigos que foram ao Brás a convite de um amigo – o Arnesto – e deram com as caras na porta. Muitos anos depois do estrondoso sucesso de “Saudosa Maloca” Adoniram compôs uma espécie de “resposta” e lançou “Abrigo de Vagabundos”, onde cita o Alto da Mooca. Saindo um pouco do samba, em 1968 ele compôs “Vila Esperança”, deliciosa marcha-rancho falando de um amor de Carnaval, lembrando os antigos carros alegóricos que durante muitos anos desfilaram nas ruas daquele bairro.
(Favela do Vergueiro, 1965-1968)
A Zona Sul abrigou Adoniran de 1955 a 1982, pois foi lá que ele construiu sua residência sita à Rua Coronel Francisco Júlio Cesar Alfierri, 406, Vila Inglesa, na região da Cidade Ademar. Nessa região da cidade ele ambientou “Mulher, patrão e cachaça”, música que trata de um triângulo amoroso envolvendo Violão da Silveira, Cuíca de Souza e Cavaquinho de Oliveira Penteado, personagens que habitavam a antiga Favela do Vergueiro, localizada onde hoje é a Chácara Klabin.
A Zona Norte foi lembrada em “No morro da Casa Verde”, onde o autor reverencia a boemia paulistana, fazendo menção a figuras do bairro.
Ainda na Zona Norte ele ambientou um de seus mais conhecidos sambas, que sem qualquer sombra de dúvida se tornou sua maior proeza: “Trem das Onze”, composta em 1964, faz referência ao saudoso trem da Cantareira, onde algumas vezes eu viajei quando ia visitar meus avós na Água Fria. Adoniran cita o Jaçanã, um dos muitos bairros servidos pela ferrovia paulistana. No ano seguinte (1965) a Cidade Maravilhosa, São Sebastião do Rio de Janeiro, comemorou seu 4º centenário e dentre as várias festividades a prefeitura carioca promoveu um concurso de músicas carnavalescas. No berço do samba a música mais tocada e vencedora do concurso tinha esses versos:
“...moro em Jaçanã, se eu perder esse trem, que sai agora às 11 horas, só amanhã de manhã...”.
(Foto de Pedro Martinelli, 1978)
Adoniran Barbosa morreu em 23 de novembro de 1982, aos 70 anos de idade. Estava internado no Hospital São Luís tratando um enfisema pulmonar, pois era um inveterado tabagista. Foi sepultado no Cemitério da Paz, conforme seu desejo. Deixou, além das músicas citadas nesta crônica, uma enorme coleção de pérolas musicais retratando a vida e os costumes da nossa cidade.
Fonte:
Crônica de Aristeu de Campos Filho
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