terça-feira, 30 de setembro de 2025

CITAÇÕES: USE COMO EPÍGRAFE ESTA FRASE DE NORBERT ELIAS

 


     “O aumento da demanda de livros numa sociedade constitui bom sinal de um avanço pronunciado no processo civilizador, porque sempre são consideráveis a transformação e regulação de paixões necessárias tanto para escrevê-los quanto para lê-los”. 

– Norbert Elias, in O Processo Civilizador – Formação do Estado e Civilização -Vol-02; tradução de Ruy Jungmann

sábado, 27 de setembro de 2025

CULINÁRIA: FAROFA DE SAÚVA

 



FAROFA DE SAÚVA: UMA CULINÁRIA ANTIGA DE ORIGEM INDÍGENA 
E QUE PERCORRE POR GERAÇÕES

A formiga içá é uma herança indígena à culinária brasileira que atrai a curiosidade de todos.



Ultimamente, com a expansão da internet, a divulgação dos mais variados conteúdos ocorre de forma simultânea. Com a chegada dos períodos de chuva na região amazônica, surge a propagação de uma prática um tanto quanto exótica para alguns, porém comum para outros, que é o consumo das formigas saúvas como alimento.

O consumo de insetos como alimento é uma prática muito frequente em países ocidentais. No Brasil, essa prática já ocorre há bastante tempo, estudos mostram que o consumo de insetos ocorre desde os povos indígenas presentes aqui quando o país foi descoberto pelos portugueses, e que foi disseminado entre eles a prática do consumo das formigas. Muitas pessoas da época comparavam a formiga Saúva ao melhor produto de outros países da época, mostrando que, além de se tratar de uma antiga prática culinária, também tem seu sabor único.

Alguns estudos mostram que a formiga Saúva, Iça ou Tanajura, assim chamada, está entre os 4 insetos mais consumidos pela população brasileira. A formiga içá é uma herança indígena à culinária brasileira que atrai a curiosidade de todos quando se ouve falar.

Falando com quem entende


A equipe do Tapajós de Fato conversou com Cristian Arapiun, que falou sobre a prática de consumir as formigas:

“Essa iguaria existe em várias partes do Brasil, não sei se pra fora do Brasil também tem, mas aqui na nossa região é muito farto quando a gente está no chamado tempo da saúva, né? Que é quando está no período chuvoso que depois da chuva o sol abre e as saúvas, que são formigas, saem do seu reino e vão voar. E nisso as comunidades tradicionais indígenas têm o costume de sair pra pegar elas. Então eu lembro que lá na aldeia as crianças, os adultos saíam com um galho de árvore pra bater nelas, elas caírem no chão e assim fazer a coleta desses animais para consumo”.


Cristian ainda fala sobre essa prática e como ela é passada por gerações em sua aldeia, e também sobre popularização da receita:

“Eu não sei exatamente a origem da ideia de comer essa ou quem começou isso, mas com certeza é de origem indígena, pois isso é passado de geração para geração. Tem gente que nunca ouviu falar, tem gente que tem nojo, mas é uma iguaria muito gostosa. E ela existe realmente pelo gosto que pode ser crua ou frita. Tem gente que já gourmetizou a saúva, que faz bolinho, que faz outros tipos de comida, mas a gente até hoje mantém a cultura de comer a saúva. É um prato muito bom”.

Como preparar a Farofa de Saúva



Essa iguaria é preparada de forma bem simples. O primeiro passo é a coleta. Normalmente, as formigas Saúvas aparecem logo após uma chuva torrencial. Ao capturar uma delas, deve-se retirar as asas, ferrão e patas. Após essa etapa, é necessário levar as formigas a uma panela para fritá-las. Após fritar bem, pode se misturar as formigas a farinha de mandioca ou comer separadamente. É uma receita bem simples, mas com um sabor único e excepcional.

FONTE:

Tapajós de Fato: 09/01/2024


quarta-feira, 24 de setembro de 2025

CITAÇÕES: USE COMO EPÍGRAFE ESTA FRASE DE ELIANE POTIGUARA

 


"O povo indígena sobrevive há séculos de opressão porque tem como maior referencial a tocha da ancestralidade, do perceber intuitivo, da leitura e da percepção dos sonhos, o exercício da dança como expressão máxima da espiritualidade e da valorização da cultura, das tradições, da cosmovisão personificada na figura dos mais velhos e das mais velhas, os idosos planetários." 

- Eliane Potiguara, in "Metade Cara, Metade Máscara". 

domingo, 21 de setembro de 2025

FRUTA: NÊSPERA

VOCÊ JÁ EXPERIMENTOU A NÊSPERA?

Conheça a nespereira, árvore que está dando seus frutos entre o Outono e Inverno

Nespereira, ameixa-amarela, nêspera

Nome científico: Eriobotrya japonica
Família: Rosaceae
Ocorrência Natural: Sudeste da China
Porte: 6 a 10 m de altura

Quando introduzida no Japão, a nêspera teve uma boa adaptação e tem sido cultivada no país a mais de mil anos. O Japão é o maior produtor mundial seguido de Israel e Brasil. Acredita-se que os imigrantes chineses levaram a nêspera até ao Havaí. Existem registros de que era comum encontrar uma pequena árvore frutífera ornamental na Califórnia em 1870.

Diferente das demais árvores frutíferas, a nespereira floresce no outono e início do inverno e seus frutos amadurecem no final do inverno e início da primavera. As flores brancas têm cerca de 2 cm de diâmetro e são organizadas em cachos.


As frutas da nespereira são ovais com uma casca aveludada e macia de cor amarelo alaranjada, às vezes rosada. A polpa é suculenta de sabor doce e levemente ácido, dependendo da variedade e maturação da fruta. A casca da nêspera é fina e pode ser facilmente puxada quando a fruta está madura. O fruto possui alto teor de açúcar, acidez e pectina. Consumido in natura é ótima opção para compor com outras frutas frescas ou em saladas de frutas. As nêsperas quase maduras são melhores para tortas. Também são muito boas para geleias, apreciadas em compotas ou utilizadas para fazer licor e vinho. Um tipo de nêsperas em calda é utilizado na medicina tradicional chinesa como expectorante para acalmar a garganta.




Como a maioria das plantas da família Rosaceae, as sementes produzem cianeto quando digeridas. A pequena concentração e o sabor amargo geralmente previnem maior quantidade de ser consumida.

Suas folhas com tonalidades verde e escuro e claro, são rígidas e possuem borda serrilhada com textura pilosa, vale tocar as folhas de diferentes árvores para experimentar a sensação tátil das diversas texturas. Muitas vezes são utilizadas como ornamentais, em ruas, praças e parques, compondo de forma interessante a paisagem.





Fonte:


quinta-feira, 18 de setembro de 2025

CITAÇÕES: USE COMO EPÍGRAFE ESTE TEXTO DE MIGUEL DE CERVANTES:

 

Cervantes por Juan de Jáuregui

Só entendo que enquanto eu durmo não tenho temor nem esperança, nem trabalho nem glória; e bem haja quem inventou o sono, capa que cobre todos os humanos pensamentos, manjar que mata a fome, água que afugenta a sede, fogo que esquenta o frio, frio que arrefece o ardor e, finalmente, moeda geral com que todas as coisas se compram, balança e peso que iguala o pastor com o rei, e o simples com o discreto. Só uma coisa o sono tem de ruim, segundo ouvi dizer, e é que se parece à morte, pois de um dormente a um morto há muito pouca diferença.”

(Fala de Sancho Pança, ao ser acordado por Quixote e ser admoestado por dormir muito, in O engenhoso cavaleiro D. Quixote de La Mancha, Segundo livro, de Miguel de Cervantes. Tradução de Sérgio Molina. 2007, p. 788).

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

ECONOMIA: OS SUPER-RICOS DO BRASIL

 Conheça os super-ricos - e saiba como você financia a fortuna deles


NOTA DO BLOG

Este texto tem exatos 10 anos. Mas é importante que se leia, porque até hoje se discute no Congresso a taxação do super-ricos, mas nenhum projeto de lei nesse sentido é aprovado. Todos são barrados por um Congresso que não se preocupa com os problemas do povo, mas com suas próprias pautas que, no momento, são para salvar da cadeia, aprovando uma anistia absurda, Bolsonaro e os golpistas.

Os impostos da classe média e dos pobres vão para o bolso dos ricos e 65,8% da renda total dos super-ricos são considerados isentos pela legislação.


Os ricos do Brasil são muito mais ricos do que você imagina. São super-ricos. E ficam mais e mais ricos a cada dia que passa. Existem duas razões principais para isso. Os impostos da classe média e dos pobres vão para o bolso dos ricos. E os ricos pagam menos imposto que a classe média e os pobres.

Só agora a gente está entendendo quem são os super-ricos do Brasil. A análise tradicional, feita com as pesquisas do IBGE, não dão conta da realidade. Um novo estudo realizado pelos economistas Rodrigo Orair e Sérgio Gobetti, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), chega mais perto. Eles analisaram os dados das declarações de imposto de renda das pessoas físicas. As conclusões são chocantes.



Segundo o IBGE, a renda média do 1% mais rico do país foi de R$ 214 mil em 2012. Mas segundo o estudo do IPEA, a renda anual do 1% mais rico é aproximadamente R$ 575 mil. Explicação: o IBGE não capta toda a renda das pessoas mais ricas, que tem muitas rendas provenientes do capital (como aplicações financeiras, aluguéis, lucros e dividendos).

R$ 575 mil já é uma boa grana: mais de R$ 40 mil por mês. Mas esses 1% ainda não são a elite. Os super-ricos do Brasil ganham acima de 160 salários mínimos por mês. São 0,05% da população economicamente ativa.

Os super-ricos brasileiros possuem um patrimônio de R$ 1,2 trilhão. Isso é 22,7% de toda a riqueza declarada por todos os contribuintes do Brasil. Essas 71.440 pessoas têm renda anual média de R$ 4.17 milhões, uns R$ 350 mil por mês. Tiveram em 2013, ano analisado pela pesquisa, um rendimento conjunto de R$ 298 bilhões.

E em 2015? Não sabemos, mas é seguro dizer que estão bem mais ricos que em 2014. Quem tem muito capital investe e recebe rendimentos financeiros enormes. Os juros no Brasil são sempre muito altos, mas agora estão estratosféricos. Trabalhar não tem nada a ver com a fortuna crescente dessa turma. Neste nível de renda, trabalha quem quer, não porque precisa.

Qual o negócio mais lucrativo e seguro do Brasil? Emprestar dinheiro para o governo. Se você tem muita grana, não precisa de criatividade para enriquecer mais e mais. Basta comprar títulos públicos do governo, que paga juros altíssimos para financiar sua dívida. E de onde vem esse dinheiro para pagar os juros? Do Tesouro Nacional, dos impostos que todos os brasileiros pagam.


Mas alguns pagam mais que outros. O detalhe mais cruel sobre a desigualdade brasileira está aí. Os super-ricos brasileiros, esses que ganham mais de 160 salários mínimos por mês, pagam só 6,51% de sua renda de imposto de renda. Você leu certo. Um assalariado que ganhe R$ 5 mil por mês paga 27,5% de imposto de renda. A elite paga 6,51%, como demonstra o estudo do IPEA.

Como isso é possível? É que 65,8% da renda total desses super-ricos são rendimentos considerados isentos e não-tributáveis pela legislação brasileira. É o caso dos dividendos e lucros. Na prática, o imposto de renda aqui só é progressivo do pobre até a classe média, que é justamente a fatia da população que mais paga imposto de renda. É uma receita perfeita para aumentar cada vez mais a desigualdade social no Brasil. É garantia de injustiça, ignorância, violência. E até de atraso em outros campos. Se fala muito que o Brasil tem pouca inovação tecnológica, mas quem vai arriscar capital investindo em inovação, se você pode faturar com juros altos e não pagar quase nada de imposto?


Essa bizarria cruel é criação brasileira. Todos os países decentes, sejam ricos ou emergentes, tributam todos os rendimentos das pessoas físicas. Não interessa se a renda do salário, de aluguel ou de dividendos. É o justo. É o mais eficiente para o bom funcionamento dos países.

O estudo do IPEA não captura com precisão absoluta a pirâmidade social brasileira. Não dá conta de dinheiro escamoteado, de caixa 2 ou remessas enviadas ao exterior. Mas já dá uma noção do tamanho do escândalo. Agora, como é focado no Imposto de Renda, não leva em consideração outra grande injustiça do nosso sistema tributário, que são os impostos indiretos.

Os super-ricos pagam o mesmo imposto sobre produtos que você, eu ou a vovó que recebe Bolsa Família. Pagam o mesmo imposto pelo arroz, o café, o remédio, o fogão. Isso significa que proporcionalmente o pobre paga muito mais imposto a classe média. E infinitamente mais que a elite.


Os super-ricos não são os vilões dessa história. As regras estão aí para beneficiá-los. Não é ilegal. Certamente há na elite gente que topa abrir mão de suas vantagens, em benefício de quem mais precisa... Mas, como era de se esperar, existem super-ricos que atuam diretamente para que esse estado de coisas continue exatamente assim: juros altíssimos e taxação mínima. Basta isso para os donos do capital ficarem mais e mais ricos a cada ano que passa, sem trabalho, sem esforço, sem contribuir para o país.

Os super-ricos têm muito poder. Influenciam muito no debate político e econômico. Abundam na imprensa argumentos a favor de que as coisas se mantenham como são. E são super-ricos os financiadores das campanhas da maioria dos políticos, claro.

A recessão radicaliza a injustiça. Penaliza o trabalhador e o empreendedor, o importador e o exportador, o estudante e o aposentado. Esta recessão não veio do espaço sideral. Foram tomadas decisões erradas no passado? Claro, muitas, desde 1500. Mas não dá para mudar o passado. O futuro felizmente está ao nosso alcance.


Esse ano e os próximos serão muito difíceis. O cenário internacional é hostil. O cobertor está curto. É imoral e improdutivo continuar enriquecendo 0,5% com o dinheiro dos impostos dos 99,5%. Enfrentar os privilégios dos super-ricos é a pauta política e econômica fundamental de 2015 e dos próximos anos. O resto é resto.

Fonte:


Autor: André Forastieri 

sexta-feira, 12 de setembro de 2025

CITAÇÕES: USE COMO EPÍGRAFE ESTA FRASE DE FIÓDOR DOSTOIEVSKY



“Quanta coisa absurda e hedionda não existe na alma humana!” 

– Fiódor Dostoievsky, in “O Idiota”, tradução de José Geraldo Vieira

terça-feira, 9 de setembro de 2025

MÚSICA: ‘LILI MARLENE’: A MÚSICA QUE NASCEU COMO POEMA ESCRITO EM MEIO ÀS TRINCHEIRAS

Uma das mais famosas canções do século 20

nasceu em meio às trincheiras. 

Entenda!


Registro do memorial de "Lili Marleen" e Lale Andersen
 na Alemanha - Huebi

O ano é 1915. Há meses, a Primeira Guerra Mundial vem devastando a Europa e mergulhando o mundo em uma maré de caos. No meio deste turbilhão, Hans Leip, um jovem professor escolar de Hamburgo, é convocado para servir a pátria alemã e mandado para a frente de batalha.

Porém, antes de ir para o front, recebe um beijo de despedida… ou melhor, dois. O que viria a ser uma das canções mais famosas do século 20, nasceu como um poema escrito por Leip em meio às trincheiras. ‘Lili Marlene’ não era uma pessoa, mas duas.

Lili, uma jovem cozinheira, e Marlene (Marleen em alemão), sua amiga de infância que se alistara como enfermeira do Exército imperial. Sozinho no campo de batalha, confortando-se nas lembranças de casa, Leip escreveu o poema para as duas moças.

Com o fim da Grande Guerra, em 1918, Leip voltou para casa, mas seus escritos ficaram esquecidos até 1937. Foi apenas durante uma arrumação doméstica de rotina que os versos foram redescobertos. Adicionou mais algumas linhas à poesia e resolveu musicá-la e publicar. Pronto! Estava traçado o destino de ‘Lili Marlene’.

Fotografia de Hans Leip 
Crédito: Domínio Público/ Creative Commons/ Wikimedia Commons

Na época, a Alemanha já vivia sob o jugo nazista e uma canção que falava das memórias de um soldado sobre uma garota enquanto este estava na guerra servia perfeitamente ao novo regime. Em 1938, o compositor Norbert Schultze, braço direito de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda do Reich, fez uma gravação e a levou ao ar em 1939.

O intuito dos nazistas era transformar ‘Lili Marlene’ em um hino de guerra do soldado alemão. Mas não foi bem isso o que aconteceu. Quando os nazistas ocuparam Belgrado (atual capital da Sérvia) em 1941, se apossaram também de sua estação de rádio, a Rádio Belgrado, famosa em toda a Europa pelo alcance de seu transmissor — segundo a propaganda da época, ela alcançava “dos fiordes noruegueses até as areias do Egito, passando pelas estepes russas”.

Lale Andersen e seu marido Artur Beul - 1953

Curiosamente, em todos esses lugares as tropas alemãs estavam combatendo. E todos os finais de tarde, a rádio tocava a canção ‘Lili Marlene’ na voz da cantora Lale Andersen. O sucesso em meio às tropas era tanto, que, pelos três minutos e 13 segundos que dura a canção original, havia uma trégua nos combates.

Contrário ao que os dignitários nazistas esperavam, ingleses, neozelandeses, sul-africanos, australianos, franceses, russos, gregos, e todos os demais que combatiam contra os alemães, se confortavam na doce voz de Lale, que os lembrava de suas namoradas e esposas em casa.

Inicialmente, Goebbels até ordenou que fosse gravada uma versão em inglês, no intuito de utilizá-la como ferramenta de guerra psicológica contra as forças da Commonwealth, mas o tiro saiu pela culatra: a canção fez ainda mais sucesso com as forças contrárias aos alemães. Para completar, Lale não era uma artista com muitas simpatias pelo nazismo e possuía vários amigos judeus.

Furioso, Goebbels proibiu a canção de ser tocada pela Rádio Belgrado e baniu Lale dos palcos. A reação foi imediata. Da gélida Stalingrado até as escaldantes areias do Saara, foram enviadas milhares de cartas para a rádio pedindo que a canção voltasse a ser tocada. Até o marechal de campo Erwin Rommel escreveu a seus superiores dizendo que o moral da tropa era melhor ao som da “doce Lili”.

Fotografia de Joseph Goebbels 
Crédito: Domínio Público/ Creative Commons/ Wikimedia Commons

Enquanto os alemães decidiam o que fazer com a música, o serviço estrangeiro da BBC se antecipou e gravou uma versão com a cantora Marlene Dietrich. Notória por suas manifestações antinazistas, ela vinha trabalhando com o departamento de propaganda das forças Aliadas desde que os EUA se juntaram ao esforço de guerra.

‘Lili Marlene’ se tornou a mais nova gravação da cantora. Na primeira transmissão da BBC, o locutor se dirigiu às tropas e, por meio da tradução em alemão, para que o inimigo pudesse entender, disse: “Você já percebeu que sua canção favorita não tem sido tocada há algum tempo? Por que será? Será que Lale Andersen foi presa? O que será que aconteceu com a pobre Lili?” e, emendando, declarou: “mas não se preocupe, Lili cantará para você por aqui agora”.

Em Berlim, diante da rasteira que levara dos Aliados e das reclamações das tropas, Goebbels permitiu que a canção voltasse a ser tocada, agora em novo horário e com uma melodia regravada por Andersen em tom mais marcial, “mais patriótico” — algo condizente com os “valores sagrados”, como disse o próprio Goebbels. Porém a nova versão não fez tanto sucesso.

Os Aliados, que a essa altura já haviam virado a guerra a seu favor, também ganhavam com ‘Lili Marlene’. Além das versões em alemão e inglês, havia em francês, russo e outros idiomas falados pelas tropas — inclusive uma “versão brasileira”. Com a chegada da FEB na Itália em 1944, foi traduzida para o português e incorporada pelos pracinhas.

Com o fim da guerra, o general Eisenhower, Supremo Comandante Aliado na Europa, chegou a dizer que Hans Leip, o autor da letra original, “era o único alemão vivendo na Alemanha de Hitler que trouxe alegria para o mundo durante a guerra”. E há relatos de ter emendado, “obrigado a essas duas moças” — referindo-se a Lili e a Marleen.

Findas as hostilidades, Lale Andersen recebeu seu disco de ouro por mais de 1 milhão de cópias vendidas. A canção era um verdadeiro sucesso. Ao longo das décadas seguintes, com a nostalgia do pós-guerra de Hollywood, várias foram as produções que contaram com a obra em sua trilha sonora.


Lili Marlene - o filme

Na Alemanha, o pai do Novo Cinema Alemão, Rainer Werner Fassbinder, revisitou Lili Marlene com seu filme homônimo de 1981. Gravada em tantos idiomas e sendo um símbolo para tantos soldados, independentemente do lado em que estavam, ‘Lili Marlene’ nos mostra que música não escolhe lado, é para todos.


Fonte:

Autor: Ricardo Lobato ( sociólogo e mestre em economia pela UNB, oficial da reserva do exército brasileiro e consultor-chefe de política e estratégia da Equilibrium — consultoria, assessoria e pesquisa)

30/01/2022


sábado, 6 de setembro de 2025

CITAÇÕES: USE COMO EPÍGRAFE ESTE TEXTO DE SALMAN RUSHDIE

 


     “Os suicídios são mais frequentes na primavera. Quando o mundo se está a apaixonar, a falta de amor fere-nos profundamente”. 

– Salman Rushdie; in “O chão que ela pisa”, tradução de Helena Ramos e Artur Ramos.

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

MEIO-AMBIENTE: AXOLOTE

 O axolote é um anfíbio endêmico do México cuja principal característica é a presença de brânquias avermelhadas ao redor da cabeça. Os axolotes estão em perigo de extinção.

O axolote é uma espécie de anfíbio cuja origem é a região central do México.

O axolote é um animal originário da região central do México e que hoje se encontra espalhado por todo o mundo. Esses animais apresentam algumas características marcantes, como a presença de brânquias, em uma coloração às vezes vibrante, e dispostas ao redor da cabeça, além de possuírem uma incrível capacidade de regeneração.

Os axolotes são capazes de regenerar membros inteiros e até mesmo órgãos do sistema nervoso, o que faz desses organismos incríveis verdadeiros modelos para estudos em Biologia do desenvolvimento e Biologia regenerativa.

A descoberta dos mecanismos que envolvem a regeneração dos axolotes e o entendimento da dinâmica de como se dão esses processos em vertebrados podem trazer importantes insights para basear estudos em Medicina regenerativa com aplicabilidade para seres humanos.

Resumo sobre axolote

O axolote (Ambystoma mexicanum) é uma espécie de anfíbio originária do México.

O seu nome tem origem asteca e remonta à mitologia da região central da Mesoamérica.

Apresenta características larvais que se mantêm mesmo na fase reprodutiva.
Pode ser do tipo selvagem, mieloide, xântico, albino ou branco, dependendo de variações em sua coloração.

Possui uma incrível capacidade de regeneração, podendo regenerar tecidos e órgãos inteiros.

Não é nativo do Brasil e só pode ser encontrado em laboratórios ou criado em cativeiro.

É uma espécie em risco de extinção na natureza.

Por sua morfologia peculiar, é um organismo que chama a atenção e causa encantamento.

O que é axolote?

O axolote, cujo nome científico é Ambystoma mexicanum, é uma espécie de anfíbio, mais especificamente de uma salamandra, pertencente ao gênero Ambystoma, que inclui outras 32 outras espécies, que ocorrem desde o sul do Canadá até a região central do México. No México foram identificadas 17 espécies diferentes, que compõem o gênero Ambystoma, sendo uma delas o Ambystoma mexicanum.

Os axolotes são utilizados como organismo modelo no estudo da Biologia do desenvolvimento e da Biologia regenerativa porque apresentam uma incrível capacidade de regeneração. Esses dois campos da Biologia buscam entender como acontecem os mecanismos que controlam o desenvolvimento dos seres vivos, e, por meio de estudos científicos tendo como base os axolotes, importantes avanços podem ser feitos para entender como ocorre a regeneração em vertebrados.

Qual a origem do nome axolote?

O nome axolote é de origem asteca e significa “monstro da água” ou “cachorro da água”. O nome está relacionado à mitologia da região da Mesoamérica que conta que Xolotl, irmão gêmeo do deus Quetzalcoatl, sofreu um destino cruel: o de ser sacrificado para que os ciclos do Sol fossem mantidos. Como forma de escapar da morte, Xolotl tentou se esconder nas águas, nas quais se transformou em um axolote.

Características do axolote

Os axolotes podem atingir 30 centímetros de comprimento e pesar entre 125 e 180 gramas. Uma das principais características dos axolotes que despertam tanta fascinação é a presença de brânquias, normalmente de coloração avermelhada, que se dispõem ao redor da cabeça do indivíduo adulto, característica essa que normalmente está presente apenas nos estágios larvais de outras espécies.

As brânquias de coloração avermelhada são uma característica marcante dos axolotes.

Outra característica interessante dos axolotes é a presença de uma cauda, característica também comum às larvas, mas que se mantém no indivíduo adulto.

Habitat do axolote

O axolote é uma espécie endêmica que ocorre em corpos de água na região central do México. Mais especificamente, os axolotes só existem atualmente na natureza em um lago específico, o lago Xochimilco, o último habitat remanescente dos axolotes, próximo à Cidade do México.

Reprodução do axolote

Diferentemente do que ocorre com a maioria dos anfíbios, os axolotes não passam pela metamorfose entre as fases juvenil e adulta, mantendo suas características juvenis mesmo após ter atingido a maturidade reprodutiva, o que é chamado de neotenia.

Alimentação do axolote

Logo após seu nascimento, os axolotes se alimentam principalmente de zooplâncton, um conjunto de microrganismos aquáticos, como rotíferos e cladóceros. Os axolotes se alimentam principalmente por sucção, por meio de uma boca larga, formada por pequenos dentes e uma língua retrátil. Quando adultos, os axolotes também se alimentam de pequenos peixes.

Tipos de axolote

Os tipos de axolotes que existem na natureza estão relacionados aos fenótipos produzidos devido a alterações na coloração. Existem quatro genes que afetam o padrão de pigmentação dos axolotes, e, quando não há mutações nesses genes, a coloração produzida é a característica do axolote do tipo selvagem.

Por outro lado, quando existem mutações nesses genes, quatro colorações distintas podem surgir, originando quatro fenótipos distintos do organismo selvagem, são eles: melanoide, axântico, albino e branco.
Axolote selvagem: é o que ocorre tipicamente na natureza. Sua coloração é de um verde-oliva bastante escuro e os olhos também são escuros.

 O axolote selvagem não apresenta mutação no gene que afeta sua pigmentação.

Axolote melanoide: conforme se desenvolve, sua coloração se torna densamente escura, ainda mais escura que a coloração característica do tipo selvagem.
Axolote axântico: é muito parecido com o melanoide, porém pode ser distinguido, pois apresenta uma coloração mais acinzentada e pequenas manchas densas na região da cabeça.

Axolote albino: indivíduo que apresenta albinismo, portanto, não possui melanina. Isso lhe confere uma coloração amarela intensa. Os olhos também não apresentam melanina, o que lhe gera uma aparência transparente.

Os axolotes albinos não possuem melanina.

Axolote branco: seus olhos são escuros e apresentam pigmentação normal, porém o corpo apresenta uma quantidade menor de melanócitos, que vão desaparecendo conforme o indivíduo chega à fase adulta. Dessa forma, o indivíduo adulto não apresenta pigmentação na extensão do corpo, mas apresenta os olhos escuros.

O axolote branco não tem pigmentação no corpo, apenas nos olhos.

Regeneração do axolote

Os axolotes possuem uma incrível capacidade de regeneração de diversas partes de seus corpos, desde estruturas externas, como seus membros, até estruturas internas, como órgãos internos, medula espinhal, cérebro, mandíbula, entre outras estruturas.

Essa capacidade faz do axolote uma espécie muito estudada pelo campo da Biologia regenerativa como forma de entender quais são os mecanismos por trás da regulação desse processo, assim como desvendar como se dá a regeneração de tecidos e órgãos em vertebrados.

Essas pesquisas podem ser utilizadas como base para estudos em Medicina regenerativa, com aplicabilidade até mesmo para os seres humanos no tratamento de lesões e doenças degenerativas.

Existe axolote no Brasil?

O axolote não é uma espécie nativa do Brasil, ou seja, não ocorre naturalmente em ambientes brasileiros. Os axolotes são uma espécie endêmica do México, ocorrendo na natureza apenas nessa região e em nenhum outro lugar do mundo. Ainda assim, eles podem ser encontrados em diversos países, inclusive o Brasil, de forma não natural, isto é, criados em laboratórios e cativeiros.

Os axolotes estão em extinção?

Os axolotes são organismos ameaçados de extinção na natureza, já que enfrentam várias ameaças à sua sobrevivência em seu habitat.

A seguir, algumas ameaças relacionadas a mudanças em seu meio ambiente e ecossistema:

Perda de habitat devido à urbanização, o que gera mudanças físico-químicas em seu ambiente natural.

Introdução de espécies invasoras, que aumentam a competitividade por recursos e a introdução de predadores.

Doenças de origem microbiológica e nutricional.

Captura para comercialização como pet.

Curiosidades sobre os axolotes

A figura dos axolotes está enraizada na cultura mexicana, sendo considerada uma criatura folclórica que faz parte do imaginário da população. Por causar tanto encantamento, não apenas no México mas no mundo inteiro, os axolotes são representados em diversos trabalhos literários, esculturas, diferentes tipos de arte e até mesmo em videogames.

A capacidade dos axolotes em manter suas características juvenis mesmo após ter atingido a maturidade causou grande confusão nos colonizadores espanhóis, que acreditaram que os axolotes eram uma espécie de peixe. Essa confusão também ocorreu, anos depois, nos naturalistas que pensaram que os axolotes eram larvas de alguma espécie de réptil ainda desconhecido. Os pesquisadores ficaram muito surpresos quando descobriram que essa “larva” podia se reproduzir, e só então compreenderam que, na realidade, se tratava da forma adulta de uma espécie de anfíbio.

Os axolotes chegaram à Europa em 1863, devido a uma expedição francesa até o México, de onde foram retirados 34 indivíduos, que foram transportados e mantidos na Sociedade Zoológica Imperial, em Paris. O encantamento com as suas características assim como a própria história e cultura dos axolotes despertaram o interesse da população, e assim se deu o início de sua propagação por todo o mundo.


Fontes

CHAPARRO-HERRERA, D.; NANDINI, S.; SARMA, S. Effect of water quality on the feeding ecology of axolotl Ambystoma mexicanum. Journal of Limnology, v. 72, n. 3, p. e46, 2013.

FROST, S.; BRIGGS, F.; MALACINSKI, G. A color atlas of pigment genes in the Mexican axolotl (Ambystoma mexicanum). Differentiation, v. 26, n. 1-3, p. 182-188, 1984.

SALDOVAL-GUZMÁN, T. The axolotl. Nat Methods, v. 20, p. 1117–1119, 2023. https://doi.org/10.1038/s41592-023-01961-5

RAMÍREZ-MACAL, D. et al. Descripción Morfométrica de la Anatomía Externa e Interna del Ambystoma mexicanum. International Journal of Morphology, v. 40, n. 2, p. 401-406, 2022.

Publicado por Nicole Fernanda Sozza

sábado, 30 de agosto de 2025

CITAÇÕES: USE COMO EPÍGRAFE ESTE TEXTO DE AILTON KRENAK:

 


     "O pensamento vazio dos brancos não consegue conviver com a ideia de viver à toa no mundo, acham que o trabalho é a razão da existência. Eles escravizaram tanto os outros que agora precisam escravizar a si mesmos. Não podem parar e experimentar a vida como um dom e o mundo como um lugar maravilhoso. O mundo possível que a gente pode compartilhar não tem que ser um inferno, pode ser bom. Eles ficam horrorizados com isso, e dizem que somos preguiçosos, que não quisemos nos civilizar. Como se 'civilizar-se' fosse um destino. Isso é uma religião lá deles: a religião da civilização. Mudam de repertório, mas repetem a dança, e a coreografia é a mesma: um pisar duro sobre a terra. A nossa é pisar leve, bem leve." 

(Ailton Krenak - in: "A Vida Não é Útil")

quarta-feira, 27 de agosto de 2025

ÁRVORE: PAU-BRASIL

 



CONHEÇA A HISTÓRIA E UTILIZAÇÃO DO FAMOSO PAU-BRASIL


De grande valor histórico e cultural para o país, o pau-brasil é considerado um símbolo nacional.

Tronco de pau-brasil, Horto em Taubaté

O pau-brasil é uma árvore nativa da Mata Atlântica brasileira, que foi amplamente explorada durante a colonização do Brasil pelos portugueses, devido à sua madeira de alta qualidade e cor avermelhada única. Hoje em dia, o cultivo do pau-brasil é uma prática importante para a conservação da espécie e para a preservação da biodiversidade da Mata Atlântica.

pau-brasil

O cultivo do pau-brasil pode ser realizado através de sementes ou de estacas. As sementes devem ser coletadas de frutos maduros e sadios, e então plantadas em solo fértil e bem drenado. As estacas, por sua vez, devem ser retiradas de galhos saudáveis e plantadas em substrato úmido e bem adubado.


pau-brasil na mata Atlantica do Rio de Janeiro: 
foto de Ricardo Cardim

O pau-brasil é uma árvore de crescimento lento, que pode levar até 30 anos para atingir a maturidade. Quando adulta, pode chegar a medir até 30 metros de altura e ter um diâmetro de tronco de até 80 centímetros. A madeira do pau-brasil é conhecida por sua durabilidade, resistência e beleza, sendo utilizada na produção de móveis finos, instrumentos musicais, cabos de ferramentas, construções e artesanatos.

Além da madeira, o pau-brasil possui outras utilidades. A casca da árvore pode ser usada na produção de medicamentos para tratar infecções respiratórias, febres e inflamações. As folhas do pau-brasil também possuem propriedades medicinais e podem ser utilizadas na produção de chás e extratos para combater a diabetes e outras doenças.

Além disso, o pau-brasil tem grande valor histórico e cultural para o Brasil, sendo considerado um símbolo nacional. A árvore é lembrada por ter dado nome ao país, devido à sua cor vermelha, que lembra o tom da brasa. Hoje em dia, o cultivo do pau-brasil é incentivado como uma prática de conservação da biodiversidade e de preservação da cultura brasileira.

Exemplar de pau-brasil fotografado durante visitas noturna guiada 
pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
Foto de Fernando Frazão /AGÊNCIA BRASIL

A medida foi tomada depois que a espécie entrou oficialmente na lista de árvores ameaçadas de extinção. Hoje, o pau-brasil encontra-se protegido por lei e seu uso é permitido apenas mediante esse projeto de preservação.



CONHEÇA 6 CURIOSIDADES 
SOBRE A ÁRVORE QUE É SÍMBOLO NACIONAL

“A história do Brasil está intimamente ligada com essa árvore'', disse o engenheiro agrônomo Yuri Tavares Rocha, doutor em geografia e professor da Universidade de São Paulo (USP) em entrevista à reportagem.

1. Pau-brasil significa “vermelho como brasa” e seu nome em tupi é Ibirapitanga

Durante os primeiros anos da ocupação portuguesa, muitas espécies animais e vegetais chamaram a atenção por não existirem na Europa, como a arara e o papagaio, por exemplo. E o pau-brasil estava entre elas desde o princípio, por conta de seu interior avermelhado.

“Os portugueses já conheciam uma árvore de madeira vermelha do mesmo gênero da C. echinata, mas de origem asiática, chamada de bresil ou bersil. Com a descoberta da espécie americana, ela também passou a ser chamada assim”, diz Tavares Rocha.

“Bresil”, segundo Rocha, quer dizer “vermelho como brasa”, fazendo uma referência ao vermelho presente no interior do tronco do pau-brasil. “Vale ressaltar que os povos originários, que já habitavam o território, ajudaram os portugueses a encontrar essas as árvores. Eles também a chamavam de ‘Ibirapitanga’ que significa ‘madeira vermelha’ na língua tupi”, acrescenta o professor.

Usado para a produção de um corante natural para tecidos, os troncos vermelhos das novas terras da América logo se tornaram um item cobiçado no mercado europeu. “A exploração do pau-brasil foi a primeira motivação da ocupação portuguesa e trazia benefícios para os comerciantes. Era mais fácil de transportar do que as árvores da Ásia e o pigmento extraído apresentava maior qualidade.”

Bosque de pau-brasil localizado na Estação Ecológica do Tapacurá, 
em Pernambuco.
Foto de Yuri Tavares Rocha

Rocha estima que cerca de 500 mil toras de pau-brasil foram enviadas à Europa entre os séculos 16 e 19. Mas esse número pode ser ainda maior.

“É uma estimativa subestimada porque a árvore não foi explorada apenas pelos portugueses. Franceses, holandeses, espanhóis e ingleses também participaram desse comércio, nem sempre de forma legal, muito menos registrada.”

2. Um país com nome de árvore: como o pau-brasil nomeou um imenso território

Vera Cruz, Terra de Santa Cruz e Terra dos Papagaios foram alguns dos nomes pelos quais a colônia portuguesa no então “novo continente” já foi conhecida.

Entretanto, chegavam cada vez mais naus carregadas de quantidades significantes de “bresil” em Portugal e, aos poucos, a relevância comercial acabou por influenciar o nome de seu território de origem. “Apesar do nome de batismo da colônia ser Santa Cruz, era comum se referir a quem trabalhava com o pau-brasil de ‘brasileiros’ e o lugar de onde a madeira vinha de ‘terra do brasil’”, conta Rocha.

“O nome também foi muito influenciado pela cartografia da época”, afirma Rocha. Segundo este mesmo artigo de 2001, os mapas europeus, naquele momento, nomeavam o lugar geográfico já como “Brasil” ou variantes como Bracir, Bracil, Brazille, Bersil, Braxili, Braxill, Bresilge.

“Os mapas representavam o território da colônia portuguesa com iluminuras (desenhos) que faziam a alusão da exploração da madeira, mostrando o tronco vermelho cortado. E, aos poucos, a colônia era mais conhecida como Brasil do que Santa Cruz”, diz Rocha.

3. Pau-brasil: símbolo de status nas roupas e de qualidade na música

tintureiros


O tamanho da influência do comércio do pau-brasil no primeiro período da colonização do Brasil pode ser explicado, segundo Rocha, pela importância do subproduto que a madeira originava: o corante vermelho.

A tintura vermelha era uma cor difícil de ser obtida, o que fazia dela um sinal de luxo. “Roupas vermelhas eram sinal de status social. O vermelho era usado por representantes do alto-clero, nobres e grandes mercadores ricos, por exemplo.”

O protagonismo do pau-brasil como matéria prima para o corante seguiu até meados do século 18 e início do século 19, quando foram desenvolvidos os primeiros corantes sintéticos. “O que aumentou e facilitou o acesso à essa tintura, derrubando a demanda pela madeira”, afirma Rocha.

Além da extração do pigmento, Rocha diz que a qualidade da madeira do pau-brasil também servia para outros fins, como a construção de móveis e decorações, principalmente para igrejas. “É uma madeira muito resistente e durável. Até hoje é possível encontrar decorações e móveis em igrejas europeias talhados em pau-brasil”, diz Rocha. Mas não espere ver um brilho vermelho nesses itens. “Ela vai ficando mais marrom com o tempo, perdendo a cor característica”.



Outro uso para o pau-brasil era na produção de instrumentos musicais. “Estudiosos da música dizem que a madeira do pau-brasil gera uma das melhores reverberações quando usada para confeccionar arcos de instrumentos de corda, como violinos, diz Rocha. Segundo ele, um arco de violino feito de pau-brasil pode chegar a custar mais de 2 mil dólares.

4. O pau-brasil é considerado a árvore nacional

Em 1961, o Ministério da Agricultura do Brasil apresentou um anteprojeto de lei ao então presidente da República, Jânio Quadros, que declararia o pau-brasil como árvore nacional.

O Ministério alegava que o mundo inteiro reconhecia o Brasil por sua flora exuberante e, portanto, seria conveniente que o país declarasse a espécie que representasse o país.

O pedido se tornou o Projeto de Lei 3380/1961, que declarou, oficialmente, o pau-brasil como a árvore nacional brasileira. Além dele, o PL também declara a flor do ipê-amarelo como flor nacional.

Flores do pau-brasil.
Foto de Yuri Tavares Rocha


5. Onde estão as árvores de pau-brasil hoje

Depois de séculos de exploração predatória, em conjunto com o desmatamento da Mata Atlântica, o pau-brasil chegou próximo à extinção. “No século 20 ele chegou a ser considerado extinto. Até ser redescoberto por populações nativas em Pernambuco, em 1928”, relata Rocha.

“Atualmente, ainda é possível encontrar populações nativas de pau-brasil no Nordeste brasileiro, principalmente no Parque das Dunas, em Natal, além do sul de Alagoas, do norte da Paraíba e em fragmentos da costa de Pernambuco”, diz Rocha.


Entretanto, não há estimativas de quantos exemplares nativos sobram na Mata Atlântica. “É uma espécie difícil de ser encontrada. Seria necessária uma expedição específica para realizar essa contagem estimada em escala nacional", diz Rocha. "É um próximo passo para a preservação da espécie."

6. O pau-brasil segue ameaçado de extinção

O pau-brasil é uma das espécies na lista das ameaçadas de extinção do Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites). A organização foi criada para regular o comércio de espécies animais e vegetais ameaçadas, prevenindo-as do perigo de extinção, considerando como ameaça o comércio internacional.

“Por ser uma espécie em risco na Mata Atlântica, ela é imune de corte por conta da legislação nacional. Mas, como ainda há interesse comercial na madeira, esse comércio deve seguir regulamentos nacionais e internacionais”, diz Rocha.

Por isso, além de manchas esparsas de exemplares nativos, também é possível encontrar raras áreas comerciais regulamentadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Atualmente, a exploração do pau-brasil só pode acontecer por meio de plantio devidamente registrado no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor) perante o órgão ambiental competente, e sua exportação depende da aprovação do Ibama.

Em julho de 2022, o Ibama instituiu diretrizes para a Estratégia Nacional de Proteção da Espécie Paubrasilia echinata (pau-brasil), as quais delimita a fiscalização – desde o plantio e estoque de empresas registradas até a comercialização final da madeira.

“É uma forma de ter certeza da origem da madeira comercializada", diz Rocha, "evitando exportações ilegais e mais danos aos poucos exemplares existentes."

O pau-brasil de mais de 600 anos:
  Indivíduo é o maior pau-brasil já documentado no país. 
Foto: Cassio Vasconcelos

Fonte: